Alimentação em Os Parceiros do Rio Bonito
mudanças nas práticas alimentares do caipira frente à urbanização
DOI:
https://doi.org/10.11606/issn.2596-3147.v1i2p169-170Palavras-chave:
Alimentação, Literatura brasileira, RuralResumo
Trata-se de uma análise de um clássico da literatura brasileira, Os Parceiros do Rio Bonito, escrito por Antonio Candido em meados de 1954, que reflete a cultura dos caipiras paulistas em um determinado momento histórico. Voltar ao passado é uma forma de compreender aspectos do presente e quiçá do futuro. A transformação dos meios de vida desse grupo social frente à urbanização pode ser profícua para refletir sobre as novas formas de ruralidade. O recorte aqui adotado refere-se à relação entre produção dos meios de vida e sociabilidade através da alimentação. Para tanto, foram selecionados para análise os capítulos 9, 10 e 11. O caipira paulista, grupo que em sua constituição combina traços culturais indígenas e portugueses e que obedece ao ritmo nômade do bandeirante, pode ser visto como uma espécie de retrato das culturas tradicionais do homem do campo, que apresentam formas de persistências e manutenção de sua autonomia e de seus modos de vida tradicionais, porém, quando confrontadas pela cultura urbana, tendem a incorporar seus traços, principalmente no que diz respeito à cultura material. Antonio Candido sinaliza que o caipira se alimentava no plano da subsistência, realizando, em média, quatro refeições ao dia: café da manhã, almoço, merenda e jantar. Apesar das restrições alimentares acompanhadas de fome fisiológica e psíquica, definida pelo autor como o desejo constante de misturas, os caipiras não se fechavam em seus universos sociais e alimentares, ao contrário, compartilhavam carnes por meio da caça, promoviam empréstimos de alimentos e davam festas. A obtenção dos alimentos foi marcada pela passagem de uma alimentação pautada pelo autoconsumo para uma onde havia crescente aquisição de gêneros do comércio. O caipira que optou por priorizar a manutenção dos aspectos culturais de sua vida se defrontou com a fome, para além daquela psíquica, a que já estava habituado e que figurava no plano dos desejos, mas a fome física que ronca e dói. Observamos outro fenômeno, o do maior isolamento e individualização entre os caipiras, que diminuíram a realização de festas e socialização da comida através do compartilhamento das carnes caçadas. Através da presente análise, observamos que as mudanças ocorridas na alimentação dos caipiras estiveram sempre associadas às mudanças econômicas e sociais, que, como resultado de incorporações progressivas da economia moderna, afetaram a organicidade da vida social e causaram rupturas em diversos aspectos da vida do grupo. Hoje, podemos concluir que o fenômeno da urbanização se constituiu como uma ameaça à Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional dos caipiras, uma vez que influenciou seus modos de plantar, retirando-lhes protagonismo e autonomia; implicou no acesso regular a alimentos, em quantidade e qualidade necessárias; alterou aspectos fundamentais para seu equilíbrio social e ecológico e contribuiu para perda de características tradicionais da alimentação.
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